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MECANISMOS LEGAIS PARA COMBATE À INSOLVÊNCIA EM MEIO À CRISE DO COVID-19

MECANISMOS LEGAIS PARA COMBATE À INSOLVÊNCIA EM MEIO À CRISE DO COVID-19

Existem inúmeros projetos tramitando atualmente no Senado e na Câmara dos Deputados visando minimizar os efeitos e consequências da atual crise econômica que vivenciamos, em razão da Pandemia.

Para o setor empresarial, temos o PL 1.397/20, de Autoria do Deputado Federal Hugo Legal, como o projeto mais relevante para combater a crise financeira e a insolvência nessa fase transitória, decorrente do Covid-19.

O Projeto tem a dupla finalidade de evitar o colapso do Poder Judiciário e prevenir a insolvência de agentes econômicos (pessoas jurídicas de direito privado, empresários individuais, produtores rurais e profissionais autônomos que exerçam regularmente as suas atividades), alterando, em caráter provisório, o regime jurídico da recuperação judicial, da recuperação extrajudicial e da falência.

Dentre as mudanças transitórias, trazidas pelo projeto para prevenção da insolvência de agentes econômicos e da distribuição em massa de pedidos de recuperação judicial por empresas, destacam-se:

 

  • Suspensão legal – A suspensão de todas as ações judiciais de natureza executiva referentes a obrigações vencidas após a data de 20/03/2020 (com exceção aos créditos de natureza estritamente salarial, decorrentes de contratos firmados ou repactuados após 20/03/2020) e das as ações revisionais de contrato, pelo prazo de 30 dias, a contar  da vigência da Lei;

 

  • Negociação Preventiva – Passados os 30 dias de suspensão, o agente econômico que comprovar redução igual ou superior a 30% do seu faturamento poderá ajuizar, em até 60 dias, e uma única vez, procedimento de jurisdição voluntária denominado negociação preventiva, que deverá ocorrer no período máximo e improrrogável de 90 (noventa) dias, a contar da distribuição do pedido, o qual suspenderá as execuções em andamento no período. Durante o prazo da negociação preventiva  o devedor e seus credores deverão buscar, de forma extrajudicial e direta, a renegociação das obrigações. O prazo é improrrogável, e caso o devedor, por qualquer motivo, peça prorrogação, o pedido será automaticamente autuado como pedido de recuperação judicial (em caso de sociedade empresária ou empresário individual).

 

  • Proteção dos devedores – Isenção de multa moratória sobre os débitos vencidos após 20/03/2020, durante os períodos de suspensão legal e de negociação preventiva, bem como impossibilidade de (i) realização de excussão judicial ou extrajudicial de garantias (inclusive fiduciárias), (ii) decretação de falência; (iii) resilição unilateral ou vencimento antecipado de contratos bilaterais;

 

  • Incentivo ao financiamento – O projeto prevê, ainda, que os créditos de financiamento e operações de desconto fornecidos durante a crise (entre 20 de março e o término de vigência da Lei, que que foi proposto para 31/12/2020) será qualificado como extraconcursal, portanto não sujeito aos efeitos de eventual recuperação judicial ou falência, enquadrando-se, para essa finalidade, no art. 84, V da Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/2005). Esta previsão é um incentivo e uma proteção para as instituições financeiras fomentarem as atividades das empresas durante a crise.

 

  • Caso não haja êxito na negociação preventiva, a sociedade empresária ou o empresário individual em crise poderão ingressar com recuperação extrajudicial ou recuperação judicial (o projeto exclui, nesse caso, os demais agentes econômicos que não se enquadram no disposto no art. 1º da Lei 11.101/2005). Contudo, o prazo de suspensão decorrente da negociação preventiva será deduzido dos 180 dias de stay period, previsto no art. 5º da Lei de Recuperação Judicial e Falência.

Em relação aos itens “1” e “2” acima expostos, o projeto não trata propriamente da concessão de uma moratória, mas de medidas que se mostram necessárias no atual cenário de Pandemia para garantir a proteção dos agentes econômicos afetados pela crise, contribuindo para que estes possam  equacionar o seu passivo durante o período de suspensão e de negociação preventiva, sem pressão dos credores e sem eminente risco de excussão patrimonial ou insolvência.

Ademais, caso aprovado, o PL 1.297/20 ainda traz uma blindagem que evita o ingresso com demandas múltiplas no Poder Judiciário, inclusive distribuição de inúmeros pedidos de recuperação judicial ou falência. Evita-se, com isso, o colapso do Poder Judiciário, além de ser uma medida sensível à crise, pois é evidente a dificuldade que se teria em se defender a viabilidade econômica de um plano de recuperação judicial no atual cenário econômico de incertezas.

Além dessas importantes novidades, o PL 1.297/20 traz também alterações provisórias e  relevantes  à Lei 11.101/2005, as quais são aplicáveis aos processos de recuperação judicial ou extrajudicial iniciados, flexibilizando-se as regras para ingresso com novos pedidos e criando-se mecanismos legais para aliviar as empresas que já tiveram o seu plano de recuperação aprovado. Entre estas alterações, destacamos:

 

  • Redução de quórum para aprovação da recuperação extrajudicial – o quórum para aprovação do plano de recuperação extrajudicial fica reduzido de 3/5 dos credores abrangidos, para “metade mais um”;

 

  • Possibilidade de ingresso com pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial com a aprovação prévia de 1/3 dos créditos abrangidos, mediante compromisso de, no prazo de 90 dias contados da data do pedido, atingir o quórum de “metade mais um” por meio de adesão expressa ao plano de recuperação extrajudicial;

 

  • Possibilidade de conversão do pedido de homologação do plano de recuperação extrajudicial em judicial, a pedido do devedor;

 

  • Ampliação dos créditos passíveis a serem incluídos na recuperação extrajudicial (todos os créditos existentes na data do pedido, exceto trabalhista, tributário e créditos com garantia fiduciária);

 

  • Não exigibilidade do cumprimento dos planos de recuperação judicial ou extrajudicial já aprovados, pelo prazo de 120 dias, a partir da entrada em vigor da Lei.

 

  • Possibilidade de apresentação de novo plano de recuperação judicial ou extrajudicial, tenha ou não sido homologado o plano original em juízo, com direito a novo stay period (art. 6º da Lei de Recuperação Judicial e Falência), com a possibilidade de inclusão de créditos posteriores ao pedido inicial (exceto financiamentos concedidos com anuência expressa do juízo da recuperação judicial).

 

  • Flexibilização dos requisitos para o ingresso com pedido de recuperação judicial ou recuperação extrajudicial, dispensando-se as exigência de que (i) o devedor não tenha obtido concessão de recuperação judicial nos últimos 5 anos, para ingresso com novo pedido; (ii) O devedor não tenha obtido recuperação judicial ou extrajudicial há menos de 2 anos, para requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial;

 

  • Aumento do piso para requerimento de falência para R$ 100.000 (cem mil reais);

 

  • Suspensão da convolação da recuperação judicial em falência, durante o prazo de vigência da Lei, no caso de descumprimento do plano homologado;

 

  • Aumento do parcelamento especial para EPP e ME para 60 meses, com possibilidade de carência de 360 dias, contados da distribuição do pedido de recuperação judicial, bem como impossibilidade de decretação de falência no caso de improcedência do pedido.

O PL 1.397/20 já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, e remetido, em 25/05/2020, para aprovação do Senado Federal.   De lá para cá, já foram apresentadas diversas propostas de emendas, dentre as quais destacamos:

 

  • Emenda de Autoria do Senador Otto Alencar, a qual propõe excluir da aplicação da Lei os produtos agrícolas para entrega de safra futura, ou que envolvam operações de troca de insumos, inclusive aqueles que são objeto de CPR (Cédula de Produto Rural);
  • Emendas do Senador Rodrigo Cunha, propondo regras para o procedimento de inclusão de créditos posteriores ao pedido de recuperação judicial/extrajudicial, na apresentação de novo plano; proposta de vigência diferente para o novo stay period, levando-se em consideração a atividade da empresa em recuperação ou o percentual de queda da receita operacional auferida nos meses de abril e maio de 2020; proposta de inclusão de possibilidade de o devedor em recuperação judicial/extrajudicial ou falência poder onerar ou alienar fiduciariamente bens ou direitos dos seus ativos circulantes ou não circulantes, independente de autorização judicial ou AGC (Assembleia Geral de Credores), desde que o bem não esteja afetado ao plano de recuperação judicial.;
  • Emendas do Senador Roberto Rocha, propondo que a Lei seja aplicada apenas a pequenas empresas e que o procedimento de negociação preventiva seja processado na Junta Comercial ou Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, excluindo o procedimento da competência do Poder Judiciário.

 

Avaliamos que a aprovação do PL 1.297/20 pelo Senado, a subsequente sanção presidencial para sua conversão em  Lei, sem restrições que venham a limitar a sua abrangência e eficiência para prevenção da insolvência,  é medida de extrema importância para possibilitar o soerguimento das empresas afetadas pela crise, e evitar inúmeras decretações de falência,  distribuições de pedidos de recuperação judicial em massa, ocasionando o colapso do sistema econômico e do Poder Judiciário.

 

Ademais, a possibilidade de uma fase de negociação prévia abrirá as portas para uma maior disseminação da cultura da solução consensual dos conflitos e da fraternidade, concedendo aos envolvidos (credores e devedores) a oportunidade de realizarem negociações importantes, de forma  transparente, com a nobre missão de contribuir não somente com a reestruturação do agente econômico afetado pela crise, mas com a reestruturação da economia brasileira.

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